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updated 6:28 PM UTC, Nov 11, 2024
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ESTEJA ATENTO: a Plural&Singular faz 10 anos e vai lançar a 28.ª edição da revista digital semestral que dá voz às questões da deficiência e inclusão

3.6. Deficiências/Incapacidades e influência na sexualidade

3.6.1. Atividade sexual das pessoas com deficiência – questões físicas e psicológicas

.A paralisia cerebral

A paralisia cerebral é caracterizada por uma lesão não progressiva no sistema nervoso central, ou seja, sem nenhuma alteração no estado clínico, este é permanente durante toda vida. Esta lesão tem origem de três formas: na gravidez, no parto ou no período neonatal (depois do nascimento). Na maioria dos casos de paralisia cerebral compromete apenas as ações motoras da criança, mas também podem surgir outras patologias associadas como exemplo: défice cognitivo, dificuldades de comunicação, falta atenção e de compreensão e/ou epilepsia.

Para compreender melhor o que é a paralisia cerebral existe a classificação dos graus e tipos de paralisia cerebral. Há vários “tipos”, vale a pena explicar os mais comuns. 

• Hipertónico: Neste tipo, as crianças têm os músculos muitos tensos, este fenómeno é a “espasticidade”. Os movimentos são muito limitados. 

• Hipotónico: Neste tipo as crianças têm os membros e tronco “moles” com um grau de espasticidade muito baixo. As crianças também têm dificuldades no sistema respiratório e na deglutição dos alimentos.  

• Extrapiramidal: Este tipo é o segundo mais comum da paralisia cerebral, é uma lesão no núcleo do cérebro. É a zona que controla os movimentos voluntários. Uma grande parte destas paralisias, não apresentam qualquer sequela percetível no corpo.  

Estes tipos de paralisia cerebral são os mais comuns, como verificamos a paralisia cerebral é uma disfunção apenas motora. Ora, quando o desenvolvimento motor é afetado em criança, o seu estado permanece mesmo em jovem e em adulta.   

Uma das problemáticas mais complexas da pessoa jovem/adulta com paralisia cerebral é da sexualidade. Por vezes esta dimensão é esquecida ou simplesmente ignorada pelos próprios, pelos seus familiares e pela sociedade. Este facto acontece por ainda ser um “tabu”, mas também considero que, este tema, ainda não está suficientemente estudado. Ora, é essencial saber que, todas pessoas são sexuadas, tendo deficiências ou não. Como já vimos anteriormente os “ tipos” de paralisia cerebral têm as suas especificidades nas limitações, estas são diferentes também na dimensão sexual. 

Os tipos Hipertónico, Hipotónico são muito semelhantes relativamente à prática da relação sexual. A espasticidade ou a falta dela, pode originar uma imobilidade sexual involuntária, ou seja, os movimentos são limitados. Estas pessoas necessitam de “ajuda” na relação sexual, nomeadamente no “toque” e na penetração. Por vezes esta aparente apatia sexual está relacionada com os estados de ansiedade. Por essa razão, é recomendável investir nos preliminares e numa boa estimulação do corpo todo. Será também importante haver momentos de pausa no ato sexual devido ao excesso de espasmos. 

No tipo Extrapiramidal, as pessoas podem ter dificuldade no ato sexual associado aos movimentos involuntários, pois estes são muito bruscos e podem magoar o (a) parceiro(a). É recomendado principalmente um ambiente calmo e tranquilo para que a pessoa com este tipo de paralisia possa melhor atingir um estado de relaxamento máximo e assim tirar e dar todo o prazer do ato. Estas pessoas necessitam também de “ajuda” na relação sexual, nomeadamente na coordenação do corpo.

A título conclusivo vale a pena salientar que a pessoa com paralisia cerebral não é doente mas está numa condição de vida diferente.

A sua parte sexual não é afetada pela paralisia. A sua necessidade de viver a sexualidade e o ato sexual é exatamente igual aos outros ditos “normais”.

A ajuda no ato sexual é normalmente incutida pelo parceiro ou parceira sexual. Devem estas pessoas, devido às suas especificidades terem ambientes calmos, tranquilos. Principalmente não podem ter limites de tempo, este deve ser ajustado a cada caso.

 

.A Sexualidade dos homens com Spina Bífida

A spina bifida é uma malformação da coluna vertebral resultante de um defeito na formação das vértebras que causa danos no sistema nervoso central.

Esta doença pode condicionar alterações a diversos níveis, em consequência da lesão neurológica: esfincteriano, podendo condicionar incontinência urinária e/ou fecal; do aparelho locomotor, podendo condicionar limitação da mobilidade. 

O nível da lesão provocada pela spina bifida depende da localização da malformação na coluna e da quantidade de terminais nervosos que se «desligaram». Logo, quanto mais alta a lesão se encontrar maior será o nível de afetação e as dificuldades da pessoa.

Apesar do desejo sexual ser considerado semelhante ao dos seus pares, os homens com spina bifida têm mais dificuldades no desempenho da atividade sexual devido à disfunção eréctil decorrente da doença. A intimidade necessita de facto, de alguns cuidados, pois as pessoas com espinha bífida podem experimentar algumas situações que diminuem as sensações e a resposta ao toque. Uma delas é a propensão para a incontinência, sendo aconselhável que ele vá à casa-de-banho antes e depois da relação sexual. Como também há uma maior suscetibilidade a infeções do trato urinário, devem ambos lavar-se bem antes e depois da relação. Algumas pessoas com espinha bífida têm maior dificuldade em atingir o orgasmo, e por essa razão é importante que a intimidade não tenha a pressão de atingir o clímax, dedicando mais tempo à exploração dos corpos e a cultivar o prazer. É aconselhável, também, que utilizem bastante lubrificante à base de água, para evitarem alergias e irritações cutâneas.

 

.Sexualidade e lesão vertebro-medular

Tipificar um procedimento para a interação sexual com uma pessoa com Lesão Vertebro-Medular (LVM) é muito redutor. Existem vários fatores condicionantes, como sejam o sexo de cada pessoa (existem reações diferentes em função do género), o nível da lesão (o que gera a diferença entre “para” e “tetra”), a extensão ou gravidade da mesma (que diferencia “plégia” e “parésia”) e outros.

O desejo e desempenho sexual não acabam após a LVM, ocorrem sim alterações orgânicas, porém não significa que acabem ou que não tenham solução. O processo mental da função sexual é o mesmo antes e após a lesão, portanto o desejo sexual permanece. No entanto as alterações na capacidade de movimentação do corpo, espasticidade e contracturas, podem dificultar a capacidade de realização do ato sexual. 

A espasticidade é a rigidez muscular que dificulta ou impossibilita o movimento, em especial dos braços e das pernas. Acontece quando se verifica uma lesão numa parte do sistema nervoso central que controla os movimentos voluntários (as lesões provocam uma alteração no equilíbrio dos sinais transmitidos entre o sistema nervoso e os músculos. Este desequilíbrio origina uma atividade acrescida ou espasmos nos músculos). Os sintomas da espasticidade podem variar desde uma leve contração muscular até uma rigidez severa.

No caso das mulheres, a menstruação geralmente pára logo após a lesão, mas o ciclo menstrual volta ao normal passado algum tempo. As sensibilidades ficam alteradas e ninguém melhor que a própria pessoa para indicar as novas zonas erógenas (habitualmente os seios, as orelhas, pescoço até as mãos ficam bem mais sensíveis). Passam a demorar mais tempo para alcançar o orgasmo, a lubrificação natural por vezes deixa de acontecer ou não é suficiente, mas a sensação de prazer intenso e a satisfação sexual existe. Para a relação sexual com penetração acontecer, após a quebra da espasticidade (caso exista), bastará o recurso a um lubrificante vaginal ou anal.

No caso dos homens, a LVM afeta todo o corpo, inclusive a função sexual, mas o desejo sexual permanece inalterado, pois a vida sexual depende de muitos outros fatores além de somente estímulos físicos como, toque, beijos ou carícias. A forma como se pensa o sexo passa a ser muito importante, os sabores, os cheiros, os sons, todo o clima que antecede o ato sexual passa a ser extremamente importante. Os estímulos visuais, por exemplo, passam a ser muito importantes já que nem sempre o corpo responde de imediato ao toque. Após uma LVM, é comum ter-se a ereção dificultada, sensibilidade alterada e até ejaculação sem que ocorra a saída do sémen (a ejaculação é um processo fisiológico e o orgasmo é um processo sensitivo, portanto, pode haver orgasmo sem ejaculação e ejaculação sem orgasmo e, embora ocorram quase ao mesmo tempo, mas não são a mesma coisa). A cultura machista segundo a qual sinónimo de masculinidade e virilidade é ter pénis ereto e penetrar a mulher até ao orgasmo em nada ajuda. Assim é necessário inventar e descobrir novas formas de contacto físico e, com muito carinho e cumplicidade tudo se resolve. O toque, os beijos, o calor do corpo, os lábios, a língua e as carícias tornaram-se ferramentas importantes e a penetração pode de facto passar para segundo plano. O prazer que vem do sexo acontece de muitas maneiras diferentes. A experiência de novas táticas associadas a boa comunicação entre os parceiros são as chaves para uma vida sexual satisfatória. Cerca de 80% dos homens vítimas de LVM têm alguma capacidade de ereção e existem fármacos, próteses e outros meios auxiliares para a conseguir. Nos casos da ereção natural, o problema mais comum é o tempo de duração e a qualidade (grau de rigidez) da ereção que, muitas vezes, são insuficientes para manter o coito. Se a relação estiver centrada na ereção, o prazer fica comprometido. Portanto, as carícias nos genitais (mesmo que sem sensibilidade) e em áreas com sensibilidade, antes, durante e após a penetração, ou mesmo sem penetração, são muito importantes. Estímulo de qualquer área do corpo onde há sensibilidade como orelhas, pescoço, costas, tórax. 

A atividade sexual de pessoas vítimas de LVM assenta fundamentalmente na capacidade de comunicação. As pessoas com sequelas de LVM poderão ter limitações físicas/motoras mas as capacidades cognitivas, em princípio, mantêm-se inalteradas. Neste particular, a qualidade das pessoas será a mesma que teriam se não tivessem sofrido qualquer lesão. Para se pensar em ter uma vida sexual ativa, ter-se-á que ter antes “resolvida” a afetação psíquica/psicológica que uma LVM acarreta. Assim sendo não se deve nunca olhar alguém vítima de LVM como um “puzzle”, como algo que se possa desmanchar a qualquer momento. O lesado transmitirá certamente o que pode ou não fazer, quais as zonas onde tem mais prazer e o que gostaria que fosse feito. Importa ainda referir que a espasticidade não mata e que, quando se desencadeia, acaba por ser ultrapassada em alguns instantes. Também um pé de alguém que tenha sofrido uma LVM não passa a ser um pezinho, uma mão não passa a ser uma mãozinha, uma cadeira de rodas não passa a ser a cadeirinha. Depois será apenas agir com naturalidade e, muito importante, esquecer que se trata de uma pessoa com sequelas de LVM.

 

.As doenças neuromusculares

As doenças neuromusculares caracterizam-se essencialmente pela falta de força muscular. Tratam-se de doenças genéticas, hereditárias e progressivas. Existem portanto várias patologias que se agrupam neste grupo de “neuromusculares”, tendo elas diferentes fases de evolução. A sua dependência para a realização das atividades de vida diária é grande.

A perda progressiva de massa muscular conduz muitas vezes a deformidades ósseas (coluna e articulações) que faz com que estas pessoas se afastem dos padrões estereotipados de beleza. 

A pessoa com deficiência neuromuscular não tem qualquer limitação da função sexual em si mesma, ou seja, desejo, ereção e ejaculação não estão afetadas pela doença. 

As limitações existentes são de ordem prática. A limitada capacidade de movimentos devido à existência de pouca força e as escassas possibilidades de posicionamento resultantes de progressivas alterações e deformidades articulares e ósseas torna a penetração mais difícil de se conseguir, todavia é possível.

De ressalvar ainda que muitas pessoas com este quadro clínico não se conseguem masturbar pelo não têm possibilidade de explorar o seu corpo. Esta impossibilidade aumenta o sentimento de carência e torna-os muito sensíveis ao toque.

 

Fonte: Grupo informal "Sim, nós fodemos"

3.6.2. Mitos e preconceitos sobre a sexualidade das pessoas com deficiência

...em desenvolvimento

3.6.3. O papel das famílias

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3.6.4. O papel dos profissionais e das instituições

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